O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional - CONSEA, através de sua Presidenta Maria Emília Lisboa Pacheco, enviou correspondência a Presidenta Dilma, no dia 02.10.2013, defendendo o PAA e a Conab, diante da operação Agro Fantasma da Policia Federal, conforme texto abaixo:
Postado pela ASNAB/GOIÁS
E.M. nº 004‐2013/CONSEA Brasília (DF), 02 de outubro de 2013
Excelentíssima Senhora Presidenta da República,
O Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA), reunido em Plenária no dia 02 de outubro de 2013, discutiu e fez proposições relativas ao Programa de Aquisição de Alimentos – PAA, com os objetivos de enfatizar a importância deste programa para o Sistema e para a Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional e de contribuir para uma nova cultura de gestão de programas intersetoriais e de cunho social.
Assim, e em continuidade as Exposições de Motivos n° 004, de 29 de abril de 2009, n°004, de 21 de dezembro de 2010 , n°005, de 28 de maio de 2012 e nº 002 de 13 de maio de 2013, este Conselho encaminha a presente Exposição de Motivos.
1. Considerações Gerais
Inicialmente, cumpre manifestar nossa satisfação com os importantes avanços obtidos com o PAA nestes 10 anos de existência. O PAA, graças aos esforços do Governo Federal e seus órgãos e entidades, destacando o relevante papel do Ministério do Desenvolvimento Social e Combate a Fome, do Ministério do Desenvolvimento Agrário e da Companhia Nacional de Abastecimento, em parceria com a sociedade civil, tem se consolidado como um importante instrumento de integração entre o fomento produtivo e econômico da agricultura familiar e a proteção social das populações em situação de risco alimentar. É importante ressaltar que este Programa tem reconhecimento internacional e é referência para vários países que tem como prioridade a garantia da segurança alimentar e nutricional.
Desde sua criação, o Programa vem crescendo tanto em relação ao aporte de recursos orçamentários disponíveis para a sua execução, quanto em relação ao número de pessoas atendidas, sejam agricultores e agricultoras familiares ou indivíduos em situação de insegurança alimentar e nutricional. Em 2003, quando o Programa teve início, foram executados cerca de R$ 145 milhões, passando para aproximadamente R$ 840 milhões em 2012. Em 2003 participaram do PAA cerca de 41 mil agricultores familiares, enquanto em 2012 este número subiu para 180.860 mil agricultores e agricultoras familiares, assentados da reforma agrária, povos indígenas e povos e comunidades tradicionais. Foram adquiridas 7 mil toneladas de alimentos em 2003 e 529 mil toneladas em 2012, quando foram atendidas 22.369 mil entidades da rede socioassistencial, alcançando milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar em todo país. O incremento de execução ocorrido no Programa ao longo dos anos demonstra a prioridade deste governo em relação às questões sociais, sobretudo, relacionadas à agricultura familiar e às questões de segurança alimentar e nutricional. São notáveis os resultados positivos alcançados pelo PAA no sentido de garantir a inclusão social e produtiva dos agricultores familiares e garantir acesso à alimentação com qualidade e regularidade àqueles que por anos viveram em situação de insegurança alimentar.
O PAA tem garantido aos agricultores familiares sua permanência no campo, na floresta e no semiárido, fortalecido sua identidade cultural, permitido a remuneração de seus custos de produção e a geração de renda com a venda do seu excedente ao Governo Federal, incentivado a criação ou o desenvolvimento de canais de comercialização da produção familiar em comunidades onde estes eram frágeis ou inexistentes, dinamizando a economia local. O Programa ainda incentiva e fortalece a organização dos agricultores familiares, estimulando o protagonismo destes na comercialização de seus produtos, afastando a figura dos atravessadores. Além disso, ele tem promovido a ampliação de estoques de alimentos e estimulado a diversificação da produção. Para os beneficiários consumidores do PAA tem‐se ampliado a diversidade e a qualidade dos alimentos, contribuindo ainda para a preservação de hábitos alimentares regionais. Diante dos inúmeros resultados positivos trazidos com a implementação do PAA, desde 2003, são inegáveis suas contribuições para a garantia da segurança alimentar e nutricional, concomitante à inclusão econômica de milhares de famílias rurais, tornando irrefutável a necessária continuidade de suas ações, bem como seu contínuo aprimoramento e fortalecimento. Qualquer retrocesso em relação ao PAA seria um retrocesso no esforço do Governo Federal de combate à pobreza e à fome e na garantia do direito humano à alimentação adequada.
É importante destacar que desde 1966, com a instituição da Política de Garantia de Preços Mínimos, através do instrumento Aquisição do Governo Federal, é permitida a compra direta, sem licitação, da produção de médio e grande porte, desde que o preço do mercado esteja abaixo do preço previsto como mínimo para safra vigente. Assim, o PAA tem um caráter inovador, pois, visando equidade, quando trata os desiguais na medida de sua desigualdade, garantiu, através do art. 19 da Lei 10.696/2003, a base legal para que a aquisição de produtos oriundos da agricultura familiar fosse possível com dispensa do procedimento licitatório. O Programa, portanto, permitiu a inclusão de segmentos que não tinham condições de se inserir no mercado institucional, e é preciso avançar, para que cada vez mais, os instrumentos de gestão e repasse de recursos públicos sejam adequados à realidade dos sujeitos de direito que atende.
A Conab vem operacionalizando e executando o PAA desde a sua criação, em julho de 2003, de forma transparente e absolutamente comprometida com os objetivos do Programa, e a importância do seu trabalho tem sido reconhecida em todos os espaços em que atua, seja nas três esferas de governo ou na sociedade civil (movimentos sociais, ONGs e outras entidades da sociedade civil). Para a implementação do PAA, é fundamental o papel desempenhado pela CONAB, seja pela sua capilaridade e capacidade de chegar a lugares no Brasil que várias políticas públicas não alcançam, seja pela sua expertise em atuar em outras políticas de governo de promoção do abastecimento alimentar. Cabe destacar que a CONAB, em 2012, executou cerca de 56% do recurso financeiro do PAA, enquanto os estados executam 38% e os municípios 6%. Nesse sentido, a CONAB é uma entidade estratégica de ação governamental na perspectiva da garantia do abastecimento e da segurança alimentar e nutricional da população brasileira.
Por outro lado a trajetória do Diretor de Política Agrícola e Informação da CONAB e Conselheiro, Sílvio Porto, mostra o compromisso com a inclusão social da agricultura familiar, a agroecologia e a segurança alimentar e nutricional. Agrônomo, o Diretor possui grande experiência em gestão municipal, com trabalhos nas prefeituras de Porto Alegre, Belo Horizonte e Betim. Trabalhou em Rondônia com indígenas e extrativistas pelo Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento – PNUD, além de ter integrado o Consea do Rio Grande do Sul. Foi colaborador do Instituto da Cidadania, integrando a comissão que criou o então Programa Fome Zero e o PAA. O Diretor foi protagonista no desenho e na implementação do PAA e tem tido, desde o início do Programa, uma conduta absolutamente comprometida com as organizações da agricultura familiar, sobretudo aquelas mais pobres e com maiores dificuldades de inclusão social e cidadã, por se encontrarem nos rincões brasileiros, onde se faz sentir em maior escala as dificuldades de acesso às políticas públicas.
O Diretor e Conselheiro é um dos principais colaboradores e também um dos mais atuantes nos debates deste Conselho, na defesa das pessoas e famílias que se encontram à margem da cidadania, sempre de forma ética, transparente e democrática. Nesses 10 anos do Programa, nas reuniões e Plenárias do Consea e nas Conferências Nacionais de Segurança Alimentar e Nutricional, que tem a participação de cerca de 2.000 pessoas representando a sociedade civil, movimentos sociais e poder público.
Diante das alegações imputadas a agentes públicos e a agricultores e agricultoras familiares, o Consea ressalta a importância de que seja observado o artigo 11 da Declaração Universal dos Direitos Humanos de 1948, o qual dispõe: “Toda pessoa acusada de um delito tem o direito de ser presumidamente inocente até que a sua culpabilidade tenha sido provada de acordo com a lei, em julgamento público no qual lhe tenham sido asseguradas todas as garantias necessárias à sua de defesa”.Tendo em vista a forma como foi conduzido o processo de investigação do Diretor e Conselheiro Silvio Porto, bem como do agente público Valmor Luiz Bordin e outros funcionários da Superintendência Regional da CONAB do Paraná e de agricultores que estão sofrendo processo de investigação no estado. Entende‐se que não foi observado o sigilo do inquérito policial expondo os investigados à opinião pública, sem o devido julgamento, violando seus direitos à honra, à imagem e à intimidade. Este tipo de conduta fragiliza nosso estado democrático de direito e põe em risco os direitos humanos.
Por fim, ressaltamos a necessidade de que os relatos que vieram à tona, ainda que sob segredo de justiça, e que supostamente tratam de irregularidades no PAA, sejam apurados com a devida isenção.
Recomendações do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional Diante das razões expostas acima, o CONSEA recomenda que:
A CONAB continue desempenhando o seu fundamental papel na promoção do abastecimento e da segurança alimentar e nutricional e, principalmente, que o PAA se mantenha como um dos principais Programas da Política Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional, sendo fortalecido, ampliado e aprimorado, nos termos já recomendados e reiterados por este Conselho.
Seja envidado o máximo de esforços do Estado brasileiro para resguardar todos os direitos fundamentais de todas as pessoas que estejam sendo investigadas até que sejam definitivamente julgadas.
Seja realizado, conforme proposto pelas entidades da sociedade civil, participantes do Comitê Consultivo do PAA, momento de reflexão e diálogo com os movimentos sociais e os Ministros da Secretaria Geral da Presidência da República, dos Ministérios do Desenvolvimento Social e Combate à Fome e do Desenvolvimento Agrário, e, posteriormente, com órgãos de controle social, a fim de aprofundar o debate sobre os aprimoramentos do Programa, levando‐se em consideração formas de gestão que atendam as especificidades do seu público titular de direitos.
Sejam fortalecidas estratégias de visibilidade do Programa de Aquisição de Alimentos, para facilitar à compreensão de seus objetivos, funcionamento e importância para a segurança alimentar e nutricional da população brasileira. Cremos, Excelência, que ao abordar essa temática e apresentar as propostas supracitadas, o CONSEA cumpre sua missão institucional e espera contribuir para a promoção da soberania e segurança alimentar e nutricional e para a realização progressiva do Direito Humano à Alimentação Adequada da população brasileira.
Respeitosamente,
Maria Emília Lisboa Pacheco
Presidenta do CONSEA