Imagine a cena: você realiza um pagamento por meio de boleto bancário, retira o comprovante, e, algum tempo depois, é cobrado novamente pelo valor que já pago.
Quando você afirma ao credor que o pagamento foi feito, mostra o boleto e o comprovante, a triste surpresa: o boleto bancário foi adulterado, e o valor que saiu da sua conta, não entrou para a conta do credor, ou seja, foi desviado para uma conta de terceiros.
Ao emitir o boleto, os dados estão perfeitos, os valores exatos, a conta está correta, mas a fraude, que ocorre no ambiente virtual onde um vírus altera a sequência numérica do boleto e insere os dados da conta do fraudador no lugar da conta do verdadeiro credor.
Neste caso, de quem é a responsabilidade?
Infelizmente, este tipo ardiloso de crime - "Golpe do Boleto" está ocorrendo com mais frequência do que se imagina, e a pessoa física ou jurídica que fez o pagamento de boa-fé não pode ser responsabilizada pelo crime do qual foi vítima e tampouco pagar novamente pelo valor já desembolsado.
Em caso de fraude, mesmo sendo causada por terceiros, as instituições financeiras tem responsabilidade objetiva (independe da existência de culpa), uma vez que é de sua responsabilidade a busca de mecanismos para evitar golpes dessa natureza.
Nessa linha, os tribunais pátrios tem entendimento firme:
“CONSUMIDOR. CERCEAMENTO DE DEFESA NÃO CONFIGURADO. PAGAMENTO DE BOLETOS BANCÁRIOS. ADULTERAÇÃO DO NÚMERO DO CÓDIGO DE BARRAS. FRAUDE. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA. 1. DESNECESSÁRIA A OITIVA DAS PARTES OU A REALIZAÇÃO DE PERÍCIA QUANDO OS ELEMENTOS DE PROVAS CONSTANTES NOS AUTOS - SOBRETUDO OS COMPROVANTES DE PAGAMENTO E RELATÓRIOS DO BANCO - PERMITEM O BOM JULGAMENTO DO FEITO. 2. SE AS EVIDÊNCIAS DOS AUTOS INDICAM A OCORRÊNCIA DE FRAUDE NO PROCESSAMENTO DO PAGAMENTO DE BOLETO BANCÁRIO POR MEIO DO SISTEMA BANKNET, MERECE SER CONFIRMADA A SENTENÇA QUE, FUNDAMENTADA NA RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO FORNECEDOR DE PRODUTO OU SERVIÇOS, CONDENOU O BANCO A RESTITUIR AO CORRENTISTA A QUANTIA INDEVIDAMENTE DEBITADA. 3. RECURSO CONHECIDO. PRELIMINAR REJEITADA. NO MÉRITO, NEGADO PROVIMENTO. 4. ACÓRDÃO LAVRADO NA FORMA DO ART. 46 DA LEI 9.099/95. . RECORRENTE CONDENADO A PAGAR AS CUSTAS PROCESSUAIS E OS HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS, ESTES FIXADOS EM 10% DA VERBA CONDENATÓRIA.(TJ-DF - ACJ: 20130110198533 DF 0019853-69.2013.8.07.0001, Relator: EDI MARIA COUTINHO BIZZI, Data de Julgamento: 06/08/2013, 3ª Turma Recursal dos Juizados Especiais do Distrito Federal, Data de Publicação: Publicado no DJE: 16/08/2013. Pág.: 268)."
“RESPONSABILIDADE CIVIL DANO MATERIAL E MORAL Serviços Bancários Adulteração do código de barras em boleto de pagamento que gerou crédito em conta de terceiro. Arguição de fraude praticada por terceiro que não afasta a responsabilidade do banco responsável pelo pagamento, em atenção ao risco da atividade que desenvolve e diante da falta de segurança dos serviços que disponibiliza aos clientes Aplicação do art. 14/CDC. Pleito do autor de que o banco por si eleito respondesse de forma solidária que não comporta acolhimento, porquanto a parte que lhe competia na transação foi devidamente executada Sentença de parcial procedência que cabe ser mantida Inteligência do art. 252 do Regimento Interno deste tribunal Recursos desprovidos.” (TJ-SP - APL: 02055861620098260100 SP 0205586-16.2009.8.26.0100, Relator: Jacob Valente, Data de Julgamento: 15/05/2013, 12ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 16/05/2013)."
“RESPONSABILIDADE CIVIL DE BANCO INTERNET OPERAÇÕES FINANCEIRAS FRAUDE DANO MORAL Apelação. Código de Defesa do Consumidor . Possibilidade de inversão do ônus probatório. Fraude em operações financeiras realizadas na página do banco-réu na "Internet". Responsabilidade de natureza objetiva do banco, fundada no risco profissional. Ameaça de inscrição do nome dos autores no SERASA. Obrigação de restituição em dobro das quantias cobradas e pagas ilegalmente. Dano moral caracterizado. Dever de indenizar. Reforma parcial da sentença. Provimento do 1. Recurso. Provimento parcial do 2. Recurso.” (TJRJ - AC 396/2005 - 6ª C. Cív. - Rel. Des. Siro Darlan De Oliveira - J. 26.04.2005)."
“AÇÃO DE INDENIZAÇÃO - INSTITUIÇÃO FINANCEIRA - FRAUDE - OPERAÇÕES BANCÁRIAS VIA INTERNET - RELAÇÃO DE CONSUMO - FALHA NA PRESTAÇÃO DO SERVIÇO - DANOS MORAIS - CONFIGURAÇÃO - 'QUANTUM'. A responsabilidade do fornecedor, em decorrência de falha na prestação do serviço, é objetiva, nos exatos termos do art. 14 do CDC, bem como do art.927, Parágrafo Único, do CC/2002. O valor da reparação não deve constituir enriquecimento sem causa, mas deverá ser desestímulo à repetição da conduta danosa. Recurso não provido. (1.0105.03.080070-7/001 (1) Relator: ROBERTO BORGES DE OLIVEIRA Data do Julgamento: 08/04/2008).”
Ao disponibilizar os serviços bancários por meio eletrônico, os bancos assumem a responsabilidade de reparar os danos que decorram da falha de segurança, como o caso de adulteração e fraude em boletos bancários.
A obrigação de ofertar segurança às operações realizadas através da internet não é do correntista, e sim da instituição financeira.
Portanto, em caso de adulteração e fraude em boletos bancários, a pessoa lesada deve buscar o ressarcimento do prejuízo perante a instituição financeira onde realizou o pagamento. Se não obtiver êxito, a vítima deve buscar as vias judiciais para reparar o dano sofrido.
Thaisa Figueiredo Lenzi
Advogada